sábado, 24 de março de 2012

segunda-feira, 19 de março de 2012

No lugar das grandes causas, microrrevoluções

17/03/2012 - 12:29


Empreendedorismo

No lugar das grandes causas, microrrevoluções

Para Edgar Gouveia Jr, diretor do Instituto Elos, a juventude empreendedora de hoje promove mudanças expressivas ao agir a partir de sua realidade local

Carolina Almeida
Edgar Gouveia Júnior, diretor do Instituto Elos
Edgar Gouveia Jr: promover mudanças tem de ser divertido (Arquivo Pessoal)
Edgar Gouveia Júnior, 46, urbanista brasileiro e diretor executivo da ONG Instituto Elos, ganhou destaque no meio acadêmico nos últimos anos por sua pesquisa e ativismo sobre mudanças globais. Parte essencial de seu trabalho é o envolvimento com os jovens. Com eles, o arquiteto nascido em Santos (SP) desenvolve no Brasil e em outros países diversos projetos, entre os quais o ‘Oásis’ – que consiste em criar soluções e espaços envolventes, concebidos para troca de experiências, em áreas carentes. A qualidade de sua atividade junto à juventude lhe rendeu o reconhecimento da prestigiada Universidade Harvard, nos Estados Unidos. Sobre workshopdado no local no início deste mês, o portal Havard Gazette o elogiou "por sua abordagem para o desenvolvimento de base e sua pesquisa sobre mudanças através da brincadeira".
Gouveia Jr. defende que os jovens atuais têm uma maneira diferente, e mais eficaz, de promover mudanças. Saem de cena o sonho com uma grande revolução e a atitude confrontadora – que tanto marcaram gerações anteriores – e entram em voga o desejo de transformar a realidade próxima e o valor dado à colaboração. Ele diz que a figura do herói solitário não existe para essa geração: o que eles querem é trabalhar em equipe.
Os jovens de hoje são adeptos do que Gouveia Jr. classifica como “microrrevoluções colaborativas”, cujas características são o trabalho de curto prazo, feito nos horários livres que eles possuem; a total liberdade para encontrar soluções, com ideias que preferencialmente não envolvam dinheiro; e a diversão, se possível ao lado de amigos. Ao aliar esses três valores, diz o especialista, esses jovens são capazes de traçar um caminho de mudança que não é considerado um fardo –  mas sim lazer.
Como os jovens de hoje podem contribuir para mudar o mundo?
Os jovens atuais são mais ágeis e querem resultados mais concretos. A transformação que buscam tem de ser consistente, aqui e agora. Como são mais “pé no chão”, eles não se pautam por sonhos de promover grandes revoluções sociais, políticas e econômicas. Seu foco é o mundo à sua volta. Chamamos essas mudanças de microrrevoluções. Os jovens hoje não se estimulam com o embate. Ao contrário. Eles querem traçar um caminho alternativo, sem usar a força, a guerra, o confronto. O que mais gostam e sabem fazer é o trabalho em grupo.
É isso que você chama de “guerreiro sem armas”?
Chamo de “guerreiro sem armas” o jovem que assume para si o compromisso de contribuir para transformar o mundo – de verdade e já – sem uso de armas ou da violência. Esse jovem desenvolve uma capacidade transformadora sim, mas que implica fazer isso com as pessoas.
Como assim “com as pessoas”? Reunindo pessoas em volta de um objetivo comum?
Sim. O que defendo e percebo que vem do jovem é o desejo de não querer ser um herói solitário. Eles têm a iniciativa e a habilidade de chamar os amigos, os vizinhos e os colegas para seus projetos. É uma vontade de partilhar suas tarefas.
Como você define a atuação do jovem hoje em dia?
Costumo descrever a habilidade deles de promover mudanças por meio de três atribuições básicas: a velocidade, a gratuidade e a diversão. Eles têm prazer e são eficientes, além de econômicos, no que fazem – o que não significa que não obtenham resultado.
Nem todo jovem é tão empolgado. O que fazer para que um número maior deles torne-se mais atuante?
Como muitos não se dispõem naturalmente, a sociedade, sobretudo os jovens que são ativistas, têm de desenvolver a habilidade de fazer convites que neutralizem os principais inibidores do impulso natural para colaborar. Chamo de “inibidores” os medos de sofrer, de perder a liberdade e de falhar. O medo de sofrer não se resume à própria pessoa, mas também ao temor de fazer sofrer quem ela ama. Há também o receio de perder a liberdade ou a autonomia, que surge quando o jovem pensa: “Se eu me envolver nisso, depois não vou poder sair” ou “vai ficar muito chato se sair”. Há aqueles que só querem se envolver se puderem oferecer algo na medida, no prazo e da maneira que bem planejarem. Por fim, existe o clássico medo de falhar, isto é, de se dedicar, acreditar em algo, e tanto envolvimento não levar ao resultado desejado.
Como eliminar, então, esses inibidores naturais da mudança?
Os desbloqueadores são simples. A proposta tem de ser rápida. Todos vivemos sob uma pressão imensa e luta-se muito para dar conta apenas da lista de tarefas do dia a dia. Aderir a uma segunda, terceira causa soa como loucura para muitos jovens. Mas se você chamá-los pra fazer algo significativo na hora do almoço, aí alguns toparão! Se for de graça, melhor ainda. Caso ele tenha liberdade para agir como quiser, aí o convite torna-se mais interessante. Se forem adicionados a esse pacote a diversão e participação dos amigos, a adesão aumenta mais um pouco. Se conseguirmos somar velocidade, autonomia e um significado, a grande maioria da humanidade vai querer contribuir.
Você tem exemplos dessas microrrevoluções?
Um exemplo foi o Jogo Oásis Santa Catarina [da época da enchente do rio Itajaí]. Destaco também os flash mobs – convocações realizadas na internet para atos-relâmpago que reúnem centenas de pessoas. E o nosso mais novo projeto, o “Play the call”, que pretende engajar 2 bilhões de pessoas nos próximos quatro anos em ações “mão na massa” para reverter o processo de destruição da biosfera.
Você considera que o saldo líquido dessas pequenas mudanças na sociedade é positivo?
Positivo é de qualquer forma. Mesmo pequenas, essas microrrevoluções transformam para melhor a vida das pessoas – e, muitas vezes, de modo definitivo. Também vejo que elas estão apontando um caminho, revelando uma tendência. Acredito que essa “onda” está chegando, se insinuando e ampliando. Minha visão é que algo bonito vem por aí se a gente trabalhar – ou melhor, brincar bem.
Como você vê o jovem líder brasileiro, especificamente?
São muitos perfis, não enxergo um padrão claro ainda. Há o jovem brasileiro – que eu gosto de ver e acompanhar – que é cada vez mais engajado socialmente, criativo, que encontra soluções jovens e inovadoras que harmonizam com sua visão de mundo. Eles são silenciosos, estão mais interessados em fazer do que aparecer, ou se promover, e sabem equilibrar transformação do mundo com bem-estar pessoal. Eles não agem como se fosse um sacrifício, mesmo quando têm dedicação total. São agregadores e gostam de chamar os outros, de trocar informações, de colaborar.
Quais dicas gostaria de deixar para esses jovens?
Seja lá o que você faça, seja lá qual for o seu “chamado” no mundo, não lute por isso. Não se sacrifique. Brinque com isso. Adicione felicidade e permita que todos os seus amigos possam participar também. O mundo que a gente está sonhando construir já começa aqui e agora. Não só lá na frente.

A Terra como tabuleiro

10.02.2012

A Terra como tabuleiro

4POR THAÍS HERRERO 
Ao longo de 2012, vários chamados serão feitos por um jogo que vai unir um terço da humanidade para mudar o mundo para melhor – e será divertido
Por Thaís Herrero
estalo“Abrace a primeira pessoa que você encontrar” é a mensagem que aparece no celular de um universitário quando sai da aula. Como o remetente é um colega que adora distribuir abraços por aí, ele aceita a proposta. No dia seguinte, pelo Facebook, outro amigo o convida para uma manifestação em defesa da Amazônia. Uma semana depois, a convocação é para limpar uma praça. Ele se lembra da ONG que trabalha com catadores de lixo e propõe uma parceria. Em todos os casos, o jovem viu nas ruas mais pessoas cumprindo as tarefas e, na internet, mensagens e fotos sobre os eventos.
Ele descobriu, então, que tudo era parte de um jogo mundial, que começava no contato virtual e ganhava a vida real. As ações somavam pontos e tinham a finalidade de fazer o bem para a comunidade.
Essa história ainda não aconteceu, mas é o objetivo do tal jogo, que está realmente em construção. Por trás da iniciativa estão o santista Edgard Gouveia Júnior, que o chamou de “Play The Call”. “Eu sonhava em fazer algo que transformasse o mundo e unisse todos, de intelectuais e empresários a comunidades carentes. Percebi que, para ser atrativo, deveria ser divertido, porque, no fundo, ninguém quer se sacrificar e nem precisa ser um herói”, explica. Ser divertido, então, é uma das cinco regras do jogo – definidas como os “cinco efes”. Além de divertidas (fun), devem ser grátis (free), rápidas (fast), espetaculares (fantastic) e amigáveis (friendly).
O Play The Call não terá vencedores nem partida final, mas a meta é clara: em quatro anos, unir 2 bilhões de pessoas para construir um novo mundo, seguindo os princípios da Carta da Terra [1] . “Esse documento é o sonho de lugar em que queremos viver e achei ideal para ser nosso guia”, diz Edgard. A plataforma on-line provisória do jogo é playthecall.com.
[1] Declaração de princípios éticos fundamentais para a construção de uma sociedade global justa, sustentável, democrática e pacífica no século XXI. O texto está em cartadaterrabrasil.org
Os jogadores realizarão tarefas e podem convocar mais participantes, até que tenham pontos suficientes para ir para a fase 2, para delegar ações. As tarefas devem ter ao menos três das cinco regras.
Edgard tem no currículo uma experiência em menor escala, mas serve de prova de que o Play The Call dará certo. Em 2009, liderou o projeto Oásis Santa Catarina, que reuniu universitários brasileiros nas cidades do Vale do Itajaí atingidas por inundações no ano anterior. Os jovens se articularam por um site e, depois, cerca de 600 foram a campo agir. Lá, reconstruíram espaços públicos e ajudaram a população a recuperar a autoestima. “Vi que o jogo poderia ser feito, porque há gente disposta a fazer o bem. Fizemos em cinco dias o que as autoridades não tinham feito em seis meses”, conta. (Confira no site tedxamazonia.com.brum vídeo em que Edgard conta sobre essa experiência).
Inspirado no Oásis SC, Edgard construiu o Play The Call com muitas mãos, durante a viagem de ano sabático que fez dois anos atrás. Espalhou a semente do jogo em países como Suécia, Índia, Nova Zelândia, Vietnã e Inglaterra, e sempre encontrou interessados e entusiastas. Ao longo de 2012, continuará levando a ideia, começando por palestras nos Estados Unidos, na Universidade Harvard. No Brasil, no fim de 2011, ele se reuniu com cerca de 200 pessoas em uma oficina de criação coletiva. De lá saiu a ideia de começar alguns protótipos este ano para testar e iniciar aos poucos as campanhas do Play The Call.
O primeiro teste será jogado pela rede Escoteiros do Brasil a partir de março, e finalizado durante a Rio+20. Até lá, 20 mil jovens vão receber 12 chamados com desafios de nível individual (por exemplo, como diminuir o volume de lixo descartado em casa) e coletivo. A tarefa final será construir casas ecológicas em cinco comunidades pobres da cidade do Rio de Janeiro.
Outra campanha-teste para todo o País começa em fevereiro com ações que serão colocadas no site e fomentadas no Facebook e no Twitter. Além disso, as ações que já têm três dos cinco efes podem ser relacionadas ao Play The Call nas redes sociais. Quem oferecer caronas, no Dia Mundial Sem Carro, por exemplo, pode divulgar como #PlayTheCall. “A ideia é ter movimentos para que, quando o jogo for lançado oficialmente, muitas pessoas já o conheçam”, diz Edgard.
O botão de “play” oficial tem data marcada para ser apertado: 21 de dezembro de 2012, propositalmente o dia das previsões apocalípticas para o fim do mundo. “Na noite do dia 20, vamos organizar festas em vários países para marcar o fim desse mundo que conhecemos e a celebração do novo, que começará e será o que sonhamos, construído com ajuda do jogo”.

Fonte: http://pagina22.com.br/index.php/2012/02/a-terra-como-tabuleiro/


quarta-feira, 14 de março de 2012

Uma jornada de transformação ao redor do tabuleiro

quinta-feira, 9 de junho de 2011  

Visão Sistêmica e Relações Humanas no Trabalho
 "O atual tipo de organização está em vigor há mais de cem anos, com alguns pequenos retoques. E os pequenos retoques agora já não bastam."
Domenico De Masi

Uma época de desafios complexos exige a capacidade de pensar e agir de forma sistêmica. Quando estamos buscando soluções, não podemos perder de vista todo o contexto em que a situação se apresenta. Assim como num jogo de tabuleiro, qualquer escolha ou movimento que façamos tem desdobramentos que afetam o todo.
Tive esse insight há vinte anos, quando redescobri a magia dos jogos de tabuleiro. Os jogos podem ser instrumentos de aprendizado e transformação, principalmente em contextos que envolvem pessoas interessadas em construir caminhos para um novo modelo de organização, de sociedade e de relações humanas.

Sentar ao redor de um tabuleiro ativa forças grupais tão primitivas quanto sentar ao redor de uma fogueira. Começa pelo simples “sentar em círculo”, que significa “estamos em posição de igualdade”. Somos convocados de uma forma meio ancestral e isso não é brincadeira, é muito sério. O círculo ativa imediatamente o sentimento de pertencimento. Ele é inclusivo e igualitário.

A origem dos jogos de tabuleiro é bastante incerta, mas há registros de jogos em diferentes civilizações. O escritor Nigel Pennick pesquisou o paralelismo entre os jogos de tabuleiro e o funcionamento das cidades, em diferentes culturas. Os jogos sempre foram usados como representação da organização geográfica e social de um povo.

O que faz do jogo de tabuleiro um instrumento tão rico para o trabalho com pessoas? Primeiramente, o tabuleiro é colocado como um elemento central, para onde as atenções convergem. Ele permite ver o cenário completo. Todos os elementos estão ali representados e é possível entender como eles interagem. Ou seja, ele dá uma visão sistêmica. É possível ver os desafios do caminho e os recursos disponíveis para superá-los.  A trilha – elemento essencial no tabuleiro – é uma metáfora do caminho a percorrer. Ela simboliza a jornada para atingir um determinado propósito.

O caráter lúdico da experiência permite abordar temas desafiadores e delicados de uma forma confortável, preservando os participantes e evitando confrontos improdutivos e desgastantes. As resistências do grupo diminuem muito quando se tem um elemento lúdico como mediador da vivência. O ganho em termos de qualidade na comunicação é imenso. O jogo é um simulador que permite aos participantes o exercício de novas possibilidades, num contexto protegido. Não há risco no jogo. Ele é muito efetivo no desenvolvimento de habilidades duradouras que resultam em transformações significativas na comunicação e nas relações interpessoais no trabalho. Isso porque ele atua muito profundamente na mudança de percepção das pessoas.

A liderança existe, mas não está restrita a uma pessoa. A liderança é um princípio, não uma pessoa - é uma liderança circular. Dessa forma, não há razão para comparar desempenhos, na disputa pelo escasso posto de líder. A competição simplesmente não tem sentido nesse contexto. A liderança não é troféu. É um equívoco pensar que a única coisa que motiva as pessoas é a competição e algum tipo de troféu. As pessoas são mais interessantes do que isso. Então, o que move as pessoas quando elas deixam de se preocupar com as comparações e disputas por conquistas individuais e de curto prazo? Outras motivações mais sofisticadas começam a surgir. Curiosamente, todos começam a dar o seu melhor. As pessoas começam a acionar outros recursos e saltam para outro patamar, como grupo.

Utilizar jogos de tabuleiro nas empresas não é uma coisa nova, mas é muito ousado. Paradoxalmente, é ousado exatamente pela simplicidade. Numa época de jogos eletrônicos e de tecnologias digitais, a proposta de trabalhar com um instrumento aparentemente “rudimentar” como um jogo de tabuleiro, parece mesmo uma brincadeira.

Você cria um contexto muito simples com os recursos essenciais. Dessa forma, o foco é colocado nas pessoas e nas relações. Liberadas das preocupações com disputas, as pessoas ingressam num outro nível de comunicação e criatividade. Elas têm a oportunidade de refletir sobre desafios comuns. Podem compartilhar experiências e percepções. Criam um espaço no qual todas são ouvidas. Caminham pelo tabuleiro juntas e percebem que podem construir e trilhar uma verdadeira jornada de transformação. Definitivamente, isso é muito ousado.

Os jogos são aplicáveis em diferentes contextos, com temas personalizados e diferentes níveis de complexidade e profundidade, dependendo do perfil do grupo. Informações sobre workshops e coaching com os jogos: sandra.happiness@terra.com.br ou (41) 3093-9989 / (41) 9841-4078


Texto: Sandra Felicidade - Psicóloga; atua como consultora, coach e psicoterapeuta, tendo como base a Psicologia Sistêmica e a Psicologia Analítica (Jung). Há vinte anos vem trabalhando com desenvolvimento de pessoas e organizações, utilizando a metodologia dos jogos cooperativos em tabuleiro. É autora de Relações em Jogo® e facilitadora do Jogo da Transformação® - credenciada pela InnerLinks Associates.
Foto: Jogo desenvolvido para a 3M do Brasil. Propósito: Visão sistêmica, capacidade crítica e criativa, inteligência coletiva.